Aproxime-te, Mesmo que Desejes
- Eduardo Worschech
- 24 de fev. de 2023
- 3 min de leitura

Desde muito cedo impuseram-me um calar, talvez por vontade de dizer, e tudo aquilo durou tanto foi o tempo que tudo acabou. Um salto pela janela e um abalo na cabeça, não era o mesmo, mas passou a ser no momento em que nasci.
Um fascínio arrebatador e uma amizade no escalar, precedido de uma queda para não mais subir. Trocou as escadas pelos degraus; que não se recorda, pois do coração só lhe restou o músculo.
Da amizade que passarinha ao coleguismo que apenas passa, chega atrasado ao seio do mar, colônia que agora não dá mais peixes. Subtraído do grande centro, perde seu prestígio na ordem inversamente proporcional da poltronaria paternal e da sobressalente pacóvia maternal.
Um contrapeso resguarda esta existência, que por mais forte que pudesse ser, nunca foi pareô para a amálgama de estultícia e descaso que atravessou mundos.
Diferentemente da janela e as inseguranças decorrentes, o azul que bate à porta permanece e é mantido em cativeiro, mesmo com todo brilho multicolorido da alegria de um ancião.
Uma automutilação transportada para um hetero e multiplicada por dois, é a sina de muitas vidas marcadas por um pecado originário; amor que não se exponencia, número menor que um.
Não só o prudente caminhou em direção aquela vida exuberante, mas outros vieram em caravana por sobre rios e desertos, enfrentaram as adversidades naturais dos enfermos, sem muito esforço, diga-se de passagem; e trouxeram o amor para seu lado, pois podiam enxergar o valor intrínseco daquele elã vital exponencial.
Um cuidado consigo foi a tônica desde a mais tenra idade, por entre camadas de calcário e rocha; submergiu um desafiante urbano do concreto e aço. Nunca houve um teto que pudesse ser seu, desapegado se tornou com os lugares onde chegou.
Desterritorialização forçada e forçosa, contribuí para seus saltos e escorregões, giros e rodopios. Gravidade desafiada, movimentos centrípetos; arranhões e muitas batidas, esforço diário de equilíbrio emocional.
Desejoso por saber, praticou a teoria muito antes da filosofia, martelou como Nietzsche e se calou como Espinosa. Dos ídolos nunca teve apreço e daqueles que sobraram foram arrastados pela gravidade até que o empuxo os puxasse para o fundo do mar; forças contrárias agindo em benefício da vida.
Da natureza do silêncio só pode ser compreendida pela natureza da fala. Função na prosa do mundo, interminável falação a todo vapor; de seu uso social, preferiu o silêncio como poesia e criação.
“Certamente que a sorte da humanidade seria mais feliz se estivesse igualmente na potência do homem tanto falar como calar-se. Mas a experiência ensina suficiente e superabundantemente que nada está menos em poder dos homens que a sua língua (...)”, dizia Espinosa.
Realçada está diferença, fez se crer pela inveja que a soberba pertencia-o, pois o risco no chão demarca até onde pode-se pisar, onde pode-se ir e imaginar. Assim, olhares difusos em perspectiva, mas concisos em segregação, mantém-se como demarcadores do chão frio e escorregadio dos valores reativos.
Vingança imaginária, escala valorativa que impõe um ódio para dentro de si mesmo, as escolhas sempre baseadas numa espécie de paralisia aos impulsos vitais é mote dos descamisados e rabugentos.
Uma lógica da subtração permeou estas subexistências e foi dada continuidade em gerações precedentes, expandindo os fatores de rejeição crônica, doença autoimune da vida.
A contramão foi ressaltada através da longa via que atravessou, cruzando escolas, rios, amizades, mares e escutas de si. Um afastamento deste acumulativo depósito de tralhas foi instintivo, sobrevivência cultural e psicológica.
No reino das virtudes intelectuais, permaneceu distante, personalidade eremítica, penitência forçada pelo desprezo da parentela de primeira geração, aquela que desfaz a vida que trouxe a baila; e mesmo passado tantos verões, ainda guarda consigo a aspereza no trato social, uma inadequação emocional e um desenlace sentimental; melancolia.
A proximal e vexatória geração, estulta de primeira ordem ainda sub-vive como aquela que não sabe porque nasceu, e espera que logo morra. De segunda ordem, reconhecida mantenedora, amargou um desfalecimento dos filhos, perecíveis genealógicos.
Derrota ou vitória não podem ser erguidas ao pedestal como monumento, pois não se concluiu o derradeiro fim. Bastante provável que o começo se dê no momento do fim.
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