Caixa Vazia
- Eduardo Worschech
- 10 de jan. de 2023
- 2 min de leitura
Atualizado: 19 de jan. de 2023

Peço por favor a um estranho para que empreste- me seu fôlego. Nada do que ele me diz consegue chegar aqui deste lado da fronteira; talvez se eu pudesse algo roubar, pudesse ser minha pelo menos por um dia. Saiu apressada e deparo com os anos que se foram, estão facilmente visíveis nas cores, nas formas e nas palavras.
Lembro me de um pai que nunca tive, que por consanguinidade era me próximo, parentalidade pela via da irmandade, como os ídolos com pés de barro. Visitávamos suas transitórias moradas, nômade por vocação, deixou vestígios bastante rudes sobre si e de quem nutria. O pouco que se basta não alimenta mais ninguém, a arrebentação já passou, mas a lazeira fez moradas em corações, que no ventrículo direito fez seu aliado, deixando um abandono a todo o resto.
Quão digno seria inspirar ao invés de apenas expirar. Dignidade não se adquiri, se ganha; não numa aposta sem vergonha, mas no respeito que se tem ao seu lado. Nada disso me foi legado, então contínuo a manipular por entre os dedos os ícones do desespero, substâncias amorfas sem memória, apenas para aplacar um sem número de frustrações.
Uma dentre muitas, quarto ou quinto alvoroço, ainda lembro com ternura o feixe aberto que ali se instalou, no corte profundo entre dois mundos, que ali se desenhou. Ainda guardo em mim esta cisão, nenhuma metrópole ou corrutela, apenas o rústico elevado ao ideal. Esta marca duradoura, que sozinha nunca ficou, se agrupou por entre os veios e conquistou uma permanência severa, mas sem que herdeiros denominativos ali ficassem. Combinação adensada por profusão, quantidade que não supera a conjugalidade, amor sem propósito ou distensão.
A manutenção de um vazio só se preenche com frugalidades, animosidades e desavenças; pois não se pode criar algo sem matéria ou onipotência, uma dimensão é sempre necessária. As hostilidade contra si lutam em desesperados momentos de culpa, autoagressão partilhada como se fosse um bálsamo da salvação. Mas nem todos conjugam com esta expiação, o que não promete que ela seja de fato efetiva em suas atribuições.
A figura de autoridade, sempre no horizonte próximo, como um manual amarelado e de pontas dobradas, calça uma existência igualmente desgastada; fator preponderante neste infortúnio, prisão sem resistência, certeza interior da punição.
Relego tudo a um segundo plano, pois num primeiro olhar turva- se minha vista, marcada pela transcendência como verdadeiro mundo. Isto tudo quer dizer que a intuição aqui não tem uso, não há fenômenos que servem de objetos de mediação, real como contraponto, planícies a se admirar.
“ Como antigamente”, abestalhadamente repito como um mantra está expressão, como se nela pudesse haver algo de criação, uma manifestação positiva, um alento a uma pobre existência ainda que dura.
Não sei nada sobre passado, presente ou futuro; “linha do tempo”, isto se parece muito mais com uma forca do tempo, laçada com um nó tão duro que mal posso respirar. Lembro- me de meu coração capenga.
Como não mereço nada além de desprezo, desmereço todo aquele que merece; filho, irmão ou quaisquer outra exclusão. Passos duros vão assentando uma morada de esquecimento para mim, para quando chegada a hora, ela não fique aqui por nem mais um segundo; volátil vida, fugaz ex
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