Como Arrematar um Ponto
- Eduardo Worschech
- 14 de mar. de 2023
- 3 min de leitura

Quando fechamos nossos olhos para depois abri-los, um mesmo universo desenha-se diante deste vulto. Se começássemos pelo negativo; muito mais assertivo, pois expõe aquilo que deixa de ser, constataríamos que uma vastidão nunca se mostra a corpo nu.
Superposição cartográfica, identificação nada agradável; acha- se que do novo encontrarás apenas uma translúcida reprodução, é o que terás.
Muitas portas, pessoas e janelas; passagens, encontros e olhares. Uma revisão acontece nestes ambientes com intrusiva presença dos gostos e preferências, alguns tropeços, mas nada que machuque. Com uma vaga certeza, uma gramática entronizada nesta história é o ponto alto: crochê, ponto cruz e um pouco de bordado.
Independentemente, se bordarmos nossa amizades, remendarmos um caso amoroso, ou mesmo manusear um cobertor para os dias de frio; devemos saber arrematar todas estas costuras.
Contudo, não é qualquer posição que se possa estar neste entrelace de situações, convenientemente postas diante de si : lace o último ponto e passe a agulha.
Não parece ser de interesse de alguém a constituição voluntária de quaisquer que sejam estes intriques, talvez se fossem intrigas ou mesmo uma alicantina atraente, de porte fino e estiloso, algo que o valha.
Voltamos então a janela aberta, que tem em sua vista o lugar de onde olha, não como espelho ou imitação; mas transposição visceral imaginativa com um toque de renda de bilro.
A atenção que se manifesta em direção aquele outro, que dependurado no varal depois de lavado e seco, marca toda a presença adjacente; decalcada pela força das formas de atenção, transliteração que deixou de reconhecer diferenças, molde inacabado e imperfeito.
Impassível condição, não sem objeções; uma escrita do outro passa pela escuta do outro, relação nem sempre capturada de imediato; cândida altivez ou talvez estupidez severa.
Então, uma muralha choca-se de frente e promove uma inusitada osmose, do meio mais concentrado para o simples receptor, abstrusa conversão. Ele chega com a pompa de uma deusa, de alvura estonteante, braços envolventes e um status invejável.
Desvanecimento energético e uma entrega de fluxo vital que por muito transfere por um único sopro todas as alegrias vividas; uma espada transpassa sua alma.
Brutal sinal de contradição, um formigamento toca seus dedos e alinhava seus braços, sutura sua visão e entorpece este coroamento. Não foi uma ojeriza que emergiu, não obstante uma confirmação de tudo que tem vivido até então.
Constrangido pela dissimulação criada pela sua própria vontade, rende- se as escusas como expiação de seu desejo carregado por um além de seu merecimento.
Retorna como se fosse um bravo cavaleiro, reluzente e tenaz combatente de uma verdade da vontade, mas o que de miragem acontece é que não pode haver um oásis onde não existe água.
As botas vão pouco a pouco deixando suas marcas no solo arenosa, ao ponto de afundarem e não mais serem vistas; mas quem de fato precisa de pernas para andar, quando são os olhos no topo da montanha que foram feitos para registrar?
Zigue zague inconstante amargura um coração, pelas suas intempéries senis na juventude, mordedura que roubou um vindouro e que cortou uma linha vital, forçando subcaminhos contingênciais, maculados pela dor; aí dele que ainda espera por transformação, sabendo que dali não é possível coser.
Nem toda linha que se enlaça encontra sua casa pra depois daquela esquina, muitas são perdidas e deixadas a deriva desta contínua viagem. De número em número, cansaço nas pernas pelo subir; subir do dia e da noite, dia que vira dia, sono que vira sonho.
Despertai, ó navegador; deixais o mar ao seu destino turbulento, sua vingança contra as naus que o desafiam; retorne ao porto do fiar, aqui tu és amigo do rei.
Comments